QUAL “RETRATO DO BRASIL”? RAÇA, BIOLOGIA,
IDENTIDADES E POLÍTICA NA ERA DA GENÔMICA*
Ricardo Ventura Santos e Marcos Chor Maio
Por exemplo, consideremos a relação entre a classificação
racial conferida a um dado indivíduo (por ele próprio ou por seus pares) e seu status
socioeconômico. Desde longa data, vários estudos realizados no Brasil, hoje
tidos como clássicos e conduzidos por autores como Oracy Nogueira, Charles
Wagley e Marvin Harris, entre outros, vêm apontando para a íntima associação
entre a percepção sobre filiação racial, por um lado, e escolaridade e renda,
por outro. Tal padrão tem sido confirmado por pesquisas mais recentes, como a
de Silva (1994) e Telles (2002). Em ambas, a cor/raça dos entrevistados foi
classificada tanto pelo entrevistador como por meio de autoclassificação.
Telles (2002) examinou dados de um levantamento de
representatividade nacional conduzido em 1995 e que incluiu aproximadamente 5
mil moradores de centros urbanos de várias regiões do Brasil, tendo
confirmado a ocorrência de associação entre escolaridade e “branqueamento” das
respostas.
Silva analisou os dados de uma pesquisa realizada em São
Paulo, em 1986, com 573 entrevistados e concluiu: “os resultados obtidos são
absolutamente compatíveis com a idéia de um ‘efeito embranquecimento’
[associado à educação e renda] […] no Brasil, não só o dinheiro embranquece,
como, inversamente, a pobreza também escurece” (1994:77-78; ênfases no
original). P.73 – 74
Os resultados das análises do DNA mitocondrial apontam
para um quadro mais complexo, tendo resultado em 170 diferentes haplotipos HVS-I,
que se agrupam em 4 haplogrupos de origem ameríndia (predominância dos
haplogrupos A e B), 8 de origem africana (predominância de L3e, L2 e L1c) e 10
de origem européia (predominância de H e U).
Segundo Alves-Silva
et alii, “a amostra total evidenciou 33% de contribuição ameríndia e 28% de
contribuição africana no conjunto total do DNA mitocondrial” (2000:454), ou
seja, “uma surpreendentemente elevada contribuição matrilinear de origem
ameríndia e africana” nos homens brancos brasileiros estudados (2000:458). P. 75
Citação colocada no texto
O Brasil certamente não é uma “democracia racial” […].
Pode ser ingênuo de nossa parte, mas gostaríamos de acreditar que se os muitos
brancos brasileiros que têm DNA mitocondrial ameríndio e africano se
conscientizassem disso valorizariam mais a exuberante diversidade genética do
nosso povo e, quem sabe, construiriam no século 21 uma sociedade mais justa e
harmônica
(Pena
et alii 2000:25). P.75
FONTE
MANA 10(1):61-95, 2004 . Disponivel em:
<http://www.scielo.br/pdf/mana/v10n1/a03v10n1.pdf >. Acesso em: 25 nov.
2013
Nenhum comentário:
Postar um comentário