Horizontes Antropológicos
Print version ISSN 0104-7183
Horiz. antropol. vol.13 no.27 Porto
Alegre Jan./June 2007
doi: 10.1590/S0104-71832007000100011
ARTIGOS
IUniversidade
Federal de Santa Catarina – Brasil
IIUniversidade Federal do Rio de Janeiro – Brasil
IIUniversidade Federal do Rio de Janeiro – Brasil
RESUMO
O trabalho trata das diferentes
interpretações da Lei de Diretrizes e Bases da Educação, de 1996, especialmente
da reformulação de seu artigo 33, de 1997, que implementou e regulou o ensino
religioso em escolas públicas. Sendo essa regulamentação referente aos ensinos
de primeiro e segundo graus, ficou a cargo dos diferentes estados por em
prática os ditames legais, através de suas Secretarias de Educação. Vamos
considerar dois casos específicos, o de São Paulo e o de Santa Catarina,
mostrando como essas diferentes interpretações da lei condicionaram o tipo de
atuação possível de agentes religiosos nos processos tanto de capacitação dos
professores como de definição de currículos.
Palavras-chave: ensino
religioso, legislação, Santa Catarina, São Paulo.
ABSTRACT
This
paper focuses on the different interpretations of the Brazilian Education Law
of 1966, with special attention to its article 33, reformed in 1997, which
regulated the implementation of religious studies in public schools in Brazil . This
regulation referred to schools of elementary and secondary levels that are
administered by State Governments, through their Secretaries of Education, thus
leaving to the States the task of applying the law. We are here considering two
specific cases, that of the State of Sao Paulo and that of the State of Santa Catarina , showing
how these different interpretations of the law conditioned the possibilities of
religious agents to act in the process of capacitating teachers as well as in
the definition of the contents of the curricula.
Keywords:
legislation, religious studies, Santa Catarina, São Paulo.
I
A universalidade pretendida pelo
discurso jurídico, em geral, tem sido objeto de vários questionamentos em
recentes trabalhos acadêmicos que tanto se propõem a questionar a possibilidade
mesma dessa universalidade, ainda que no contexto de Estados nacionais, como a
discutir a descontextualização operada pela linguagem abstrata do direito, que
nega as subjetividades do outro (Santos, 2005, p. 139). No âmbito da
antropologia, esse questionamento é histórico, na medida em que as questões
suscitadas pelos diversos colonialismos colocaram na pauta da disciplina a
presença constante do(s) outros(s), em contextos políticos. Nosso trabalho se
inscreve nessa perspectiva, buscando mostrar, através da discussão da aplicação
regional de uma lei federal, a importância dos critérios políticos e culturais
nas condições locais de sua atualização, com conseqüências interessantes para
uma contínua reflexão sobre a relação entre Estado e religião no Brasil.
Partimos, portanto, do pressuposto que o direito (e a lei) é um discurso
socialmente produzido a partir de um corpo de leis escritas, cujos critérios
culturais de exercício não se limitam à ordem geral da produção legislativa,
mas o modificam de acordo com as condições locais (contextos políticos) que definem
sua interpretação (Dickie, 1996, p. 53). Sendo a lei escrita a referência para
seu exercício, ela opera como que uma esqueletização – como diz Geertz (1983) –
do fato a que se refere, esqueletização a partir da qual a interpretação é
produzida.1 Essa interpretação é resultado do encontro do intérprete com a
lei, e, portanto, um encontro ambientado no momento do encontro. Momento, aqui,
incluindo a posição específica do intérprete no ambiente e as relações de poder
que o configuram. Assim, ainda que este trabalho não se proponha a um estudo do
processo político de implementação da lei,2 tem como pressuposto que seja possível, através de um estudo da
interpretação da lei, num desenvolvimento da pesquisa, atingir de forma mais
abrangente a dimensão política que contextualiza aquela implementação.
A lei em questão é aquela referente
à implantação do ensino religioso em escolas públicas, lei nº 9394, de 20 de
dezembro de 1996, em especial seu parágrafo 33, modificado pela lei nº 9475, de
22 de julho de 1997.
II
Um breve histórico da aprovação
dessa lei e de sua modificação é importante para que se perceba, já na sua
promulgação, o desempenho de um forte lobby das igrejas cristãs, em
especial da liderança aberta ou não da Igreja Católica Apostólica Romana. Esse lobby
se fez desde o período da Assembléia Nacional Constituinte, quando entidades
como a Associação Interconfessional de Educação de Curitiba (Assintec) do
Paraná, o Conselho de Igrejas para Educação Religiosa (Cier) de Santa Catarina,
o Instituto de Pastoral de Campo Grande, Mato Grosso (Irpamat) e o Setor de
Educação da CNBB, principalmente o Grupo de Reflexão Nacional sobre Ensino
Religioso da CNBB (Grere), assumiram as negociações, legitimadas por
coordenadores estaduais de ensino religioso dos estados onde ele já era
regulamentado.3
Este lobby conseguiu
garantir a presença do ensino religioso na Constituição de 1988, em seu artigo
210, parágrafo 1º, que diz: "O ensino religioso, de matrícula facultativa,
constituirá disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino
fundamental". Mas ele se fez mais intenso e mais abrangente durante o
período de elaboração da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação, só promulgada
em 1996, a
que ficou conhecida como Lei Darcy Ribeiro.4 É durante esse período que se constitui o Fórum Nacional
Permanente do Ensino Religioso (Fonaper), uma organização voluntária, de âmbito
nacional, composta por cristãos de diversas origens.
Um ponto crucial defendido por
estas instituições não foi incorporado na LDB: que fosse explicitada a
responsabilidade financeira do Estado no pagamento dos professores de ensino
religioso. Por isto, o lobby continuou para que o art. 33 dessa lei
(onde cabia o tratamento dessas questões) fosse modificado. Em 22 de julho de
1997 foi sancionado o substitutivo do art. 33, com o número 9475, substitutivo
de autoria do padre Roque Zimmerman e que define o ensino religioso como
disciplina normal do currículo das escolas públicas, sendo do Estado a
responsabilidade pela contratação de professores.5 Mais: mantém o ensino religioso como de matrícula facultativa;
deixa aos estados da federação a definição dos critérios para contratação dos
professores; determina que o ensino religioso não pode ser proselitista e que
as Secretarias de Educação devem ouvir entidade civil, "constituída pelas
diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos de ensino
religioso" (Brasil, 1997 apud Fonaper, 1998a, contracapa).6
A relação estabelecida pela lei
entre a responsabilidade do Estado, o não proselitismo e a existência de uma
entidade civil que atue como consultora sobre os conteúdos é, ao mesmo tempo, o
substantivo que legitima o ensino religioso e problematiza sua realização.
Realização essa dependente da interpretação da lei que vai obedecer a um jogo
de poder entre o Estado e "a religião", esta última assumindo
diferentes configurações nos dois estados que são o foco deste trabalho. É
importante assinalar que o Fonaper estimulou a criação, nos diferentes estados,
de Conselhos para o Ensino Religioso (Coner), que assumiram ser a
"entidade civil" considerada pela lei como assessora das Secretarias
de Educação para os conteúdos do ensino religioso. Os próximos dois itens se
ocuparão do desenvolvimento da implantação do Coner nos estados de São Paulo e
Santa Catarina.
III
Em São Paulo o ensino religioso foi
regulamentado e implantado em 2001, através da lei nº 10.783/2001, após longo
processo de aprovação do projeto de lei7 na Assembléia Legislativa, que teve início no primeiro mandato de
Mario Covas (1994) e se estendeu até o governo de seu sucessor, Geraldo
Alckmin. O processo de implantação culminou com a aprovação, em 27 de julho de
2001, da deliberação nº 16, do Conselho Estadual de Educação, que determinou
que compete aos professores graduados em História, Ciências Sociais e Filosofia
ministrarem as aulas de ensino religioso.
Através de uma tomada de preços, a
Secretaria de Educação convocou professores doutores do Departamento de
Pós-Graduação em História da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) para
realização do material que capacitou os professores da rede pública de ensino.
O material trata da história das religiões, enfatizando a questão da
"tolerância ativa" e foi através dele que a capacitação aconteceu
também no interior do estado através de videoconferências e seminários.
Além disso, em São Paulo, o ensino
religioso foi instituído nas séries finais do primeiro grau (5ª à 8ª), sendo
que hoje em dia pertence ao horário normal de aulas. Nas séries iniciais (1ª à
4ª) os próprios professores responsáveis pela classe ministram as aulas de
ensino religioso, que foi considerado pela lei "tema transversal", ou
seja, incluído no conteúdo das disciplinas já existentes.
Para o Conselho Estadual de
Educação e Secretaria de Educação, a escolha pelo tema "História das
Religiões" cumpre perfeitamente o papel de ensinar sobre religião
sem que nenhuma religião fique de fora e principalmente sem que haja qualquer
tipo de proselitismo nas aulas. Para a diretora da Coordenadoria de Estudos e
Normas Pedagógicas (Cenp) da Secretaria de Educação de São Paulo, Valéria
Souza, "o Estado, na pessoa do Conselho de Educação, tem legitimidade para
escolher o conteúdo da disciplina (ensino religioso) e o fato de São Paulo ter
optado por História das Religiões não ofende nenhum preceito legal". Para
ela o importante é não haver confessionalidade e nem proselitismo, "assim
como determina a lei". Nessa perspectiva, o estado desconsiderou o quesito
legal da assessoria por "entidade civil", privilegiando, como
critério da legalidade de seu procedimento, a garantia do não proselitismo.
Essa interpretação da lei, que
compreende o não proselitismo e a não confessionalidade como "história das
religiões" é objeto de sérias criticas pela Associação de Professores do
Ensino Religioso do Estado (Asper-SP), talvez o interlocutor mais ativo nesse
tópico. Para essa associação, falar de história das religiões faz parte da
disciplina "História" e não da disciplina "Ensino
Religioso". Para eles, o conteúdo do ensino religioso é aquele descrito
pelo Fórum Permanente para o Ensino Religioso (Fonaper). A diretora da Asper,
Nerva Gerbi, vê no caso paulista um "sério problema de interpretação da
lei (LDB)". Nos parâmetros do Fonaper (1998b) lê-se que a finalidade do
ensino religioso é
subsidiar o conhecimento através do
tratamento didático de eixos de conteúdos que incluem: culturas e tradições
religiosas; escrituras sagradas e/ou tradições orais; teologias; ritos e ethos,
para ir sensibilizando para o mistério, capacitando para a leitura da linguagem
mítico simbólica e diagnosticando a passagem do psico-social para a
metafísica/Transcendente.
Esses elementos e essa perspectiva
não só não estão consideradas na implantação do ensino religioso pela
secretaria como aparecem para ela como impróprios para a escola pública, pois
contradizem as normas pedagógicas instituídas pelo Conselho de Educação.
Interessante observar que a
justificativa da secretaria de que a escolha do conteúdo foi a "mais laica
possível" vem de encontro com o posicionamento do ex-governador através do
decreto nº 46.802, de 2002, que prescreve que o ensino religioso deve
"assegurar o respeito a Deus", transparecendo sua visão teísta e
minando o próprio tom relativista pretendido pelo Conselho de Educação (Lui, 2006).
Ainda mais contraditória é a definição do objetivo do ensino religioso,
encontrada no relatório da deliberação do Conselho de Educação, que diz assim:
"a preocupação da implantação do ensino religioso está na promoção da
cidadania através do compromisso com valores como honestidade, justiça, amor ao
próximo, bondade e solidariedade", ou seja, com referência a valores
ético-religiosos.
O Conselho de Ensino Religioso
(Coner/SP), criado, em tese, para assessorar o estado nos assuntos referentes
ao ensino religioso, não teve qualquer participação na programação do ensino
religioso ou no processo de capacitação dos professores. Na sua avaliação, que
o ensino religioso trate somente de história das religiões é uma
"desvalorização do ensino religioso". Interessante notar, no entanto,
que no histórico do Coner/SP, a aproximação com a Secretaria de Educação sempre
foi problemática. Quando se constituiu, atendendo a um chamado do Fonaper, que
os fundadores insistem em afirmar ter sido feito "a todas as religiões",
teve como articulador mais importante um padre da linha progressista da Igreja
católica, há muito vinculado ao ensino religioso, em clara composição com os
setores evangélicos históricos. A trajetória do Coner/SP foi construída,
principalmente, por denominações cristãs, e somente em 2004 não cristãos
começaram a participar ativamente do grupo, ainda que não formalmente filiados.8 A rigor, na própria avaliação de alguns participantes antigos, o
Coner/SP não está cumprindo com os critérios definidos por lei para sua própria
constituição. No entanto, as iniciativas no sentido de cumpri-la são lentas,
esparsas e pouco articuladas.
A possibilidade/capacidade de articulação
política do Coner/SP parece ter se debilitado fortemente com o falecimento, em
2003, do seu primeiro presidente, que foi substituído por um padre católico de
linha conservadora. Em 2001 o Coner/SP não estava suficientemente estruturado
para não depender da figura do líder, e essa estruturação permanece um alvo a
ser atingido. O que estamos chamando de estrutura se relaciona menos ao
formalismo dos cargos do que ao compartilhar de um ideário claro e firme sobre
o ensino religioso. Hoje, dentro do próprio grupo, em que pese haver um
trabalho dirigido a promover, nas aulas de ensino religioso, um "diálogo
inter-religioso", não há consenso sobre se o ensino religioso deve ou não
existir como parte do currículo escolar das escolas públicas. Por outro lado, a
corrente interna ao Coner que concorda com os parâmetros do Fonaper, se
esforça, promovendo seminários entre os participantes, no intuito de gerar o
convencimento e uma pauta de ação. Eles denominam esses seminários de
"capacitação interna", e o justificam como caminho para o
fortalecimento do grupo, para uma melhor compreensão do dispositivo legal e,
conseqüentemente, para uma instrumentalização do grupo tendo em vista futuras
negociações com a secretaria. Os seminários são abertos para os professores da
rede pública e representante da Secretaria de Educação tem sido convidado para
todos eles. Vale ressaltar o que já dissemos acima: em 2002, o Coner/SP não
teve nenhuma participação no processo de capacitação de professores de ensino
religioso levado a efeito pela Secretaria de Educação.
Nesse momento, o Coner/SP ainda se
debate na tentativa de definir seu papel, sua razão de ser, e especialmente
porque continua a ter dificuldades de acesso à Secretaria de Educação.9 De acordo com os arquivos do Coner/SP a que nos foi permitido o
acesso, durante o período da primeira presidência houve vários ofícios à
Secretaria de Educação, com consultas, que foram respondidos. Mas os convites
não foram honrados. Poder-se-ia dizer que a dificuldade de acesso tem dois
lados e duas versões: se o Coner se ressente da sua não participação no
processo de formação de professores e definição de conteúdos de ensino religioso,
a secretaria justifica sua impossibilidade de atender aos convites por falta de
tempo. E dela se ouve que está aberta para receber – e sempre recebeu –
qualquer pessoa ou entidade que queira se manifestar a respeito do ensino
religioso. Mas na sua interpretação da lei, a secretaria não abre mão de
afirmar que qualquer outro conteúdo para o ensino religioso, além daquele por
ela estipulado, seria proselitismo. Importante notar que os cursos de Ciências
da Religião no estado não são cursos de licenciatura. Como mencionamos acima,
de acordo com a lei instituinte do ensino religioso em São Paulo, os
licenciados em História, Ciências Sociais e Filosofia são os candidatos a
professores de ensino religioso na rede pública. A secretaria assumiu
totalmente a administração do ensino religioso.
Do ponto de vista do Coner/SP e da
Asper (que é a presença mais constante na secretaria, com freqüência batendo de
frente com os ditames dela), o Estado de São Paulo, na sua interpretação da
lei, retirou do ensino religioso sua substância: sua autonomia como disciplina
e seu propósito, desqualificando-a como história das religiões. Ressalte-se que
a crítica do Coner/SP se prende à redução que isso significou, já que História
das Religiões é considerada uma parte somente do que a disciplina deveria
abranger com a finalidade de "sensibilizar para o mistério". Por
outro lado, a não indicação de professores especializados para as primeiras
quatro séries do ensino fundamental são também evidência, para o Coner/SP e a
Asper, da retirada da autonomia da disciplina. Do ponto de vista do estado, a
questão mesma da existência do ensino religioso aparece como anacrônica. Há, na
sua opção pela História das Religiões não só uma resistência do estado laico em
ceder espaço para o "religioso", como a clara intenção de que,
respeitadas as escolhas individuais dos cidadãos, compete ao Estado a
regulamentação do espaço público e, portanto, de direito, definir os limites,
nele, da "Religião".
IV
Em Santa Catarina houve uma maior
agilidade da "Religião" na consolidação de sua participação no
processo de interpretação e implementação da nova lei. Já estava
institucionalizado no estado um Conselho de Igrejas para o Ensino Religioso
(Cier), formado por igrejas cristãs, numa perspectiva ecumênica, mas sob a
hegemonia da Igreja Católica Apostólica Romana (Dickie, 2003), e em constante
diálogo com o estado. A oportunidade apresentada pela nova lei, em 1997, foi
logo abraçada pela liderança do Cier. Na sua interpretação, formar um novo
conselho, mais amplo e abrangendo outras religiões era uma oportunidade de
trazer novos aliados para o ensino religioso, assumido como uma causa. Desde
logo, membros do Cier, liderados por um bispo católico, consolidaram uma
aliança entre representantes das igrejas luteranas (IECLB e IELB) e da
comunidade muçulmana na formação do Coner. Nessa formação participou uma
representante da Secretaria da Educação – já participante do Cier. E no
primeiro ano de sua existência, o Coner encetou campanhas de adesão, com
convites por carta e por contatos pessoais a todas as agremiações religiosas do
estado e, ainda que a maioria de seus membros advenha de igrejas cristãs,
conseguiu a participação de não cristãos de diversas origens, com assento,
inclusive nos cargos administrativos e de representação. Na interpretação do
Coner/SC, a palavra "denominações" inscrita na lei não pode ser
com-preendida como se referindo unicamente a religiões que tenham uma estrutura
institucional e/ou registro publico como igreja.10
Por interferência direta do Coner
junto ao Governador do Estado,11 instalou-se um grupo de trabalho que se reuniu por um ano, uma
vez ao mês, no prédio da Secretaria de Educação e com técnicos designados,
para, sob a liderança do Coner, discutir e consolidar os programas de ensino
religioso para o Estado, de acordo com a nova lei. Desse grupo participaram os
professores dos Cursos Magister em Ciências da Religião,12 cursos autorizados pela Secretaria de Educação para diplomar os
professores da rede pública que já ministravam ensino religioso. Participaram
também teólogos de varias "denominações" e alunos dos cursos
Magister, de forma menos sistemática.13 O Coner trabalhou, concomitantemente, na consolidação de
princípios comuns em suas sessões particulares e foi com esses princípios
definidos que defendeu sua posição como interlocutor do estado e dos demais
participantes do GT.
Apesar desse desenrolar dos
acontecimentos, houve por parte do estado uma resistência em reconhecer o
Coner/SC como entidade com a qual devia dialogar. A pessoa então responsável
pela Secretaria de Educação cumpriu a lei, mas discordava frontalmente da
possibilidade do ensino religioso não ser proselitista e deixou isto claro para
o Coner. De forma mais sutil, foi modificada a estrutura das coordenações
regionais da Secretaria de Educação, de forma a diluir a coordenação de ensino religioso
no âmbito de coordenações mais gerais. Não por acaso, nessa ocasião o Coner/SC
dependeu diretamente da negociação com o governador para implantação do GT e,
conseqüentemente, sua legitimação como interlocutor. Ao fim da duração do GT, a
secretaria reformulou e publicou as Diretrizes Educacionais do Estado para
as Escolas Públicas, documento no qual figuravam as disciplinas que compõem
os currículos do ensino básico, e entre elas não constava o ensino religioso.
Durante as reuniões do GT era clara a crítica dos representantes da Secretaria
de Educação ali presentes ao que chamavam de "detalhismo" do Coner/SC
na discussão e definição de princípios, vistos como "muito
teológicos", considerando tal esforço um postergador de tomadas de decisão
quanto aos conteúdos de ensino religioso. Ia sem ser dito que o
"detalhismo" tratava de questões que os representantes da secretaria
não consideravam relevantes na "aplicação prática" do ensino
religioso, o que sugere uma discordância de fundo sobre os conteúdos da disciplina.
Ainda assim, ressalte-se que em Santa Catarina a Secretaria de Educação fez e
mantém um acordo com o Coner sobre suas atividades. Iniciadas em 1998, essas
negociações e desde então efetivado o acordo, só em 2006 foi regulamentado o
ensino religioso no Estado de Santa Catarina.14
O estado tem justificado o ensino
religioso e seu apoio a ele, em especial após a mudança do governo em 2003, a partir de um
diagnóstico da "disnomia da vida moderna" (Romano,1979, p. 127) que
aponta a "ausência de valores" e a "evidente" incompetência
da família em adequadamente fornecê-los, fenômeno concomitante ao crescente
individualismo. O ensino religioso seria um elemento formador e transformador
para os jovens, estimulando a solidariedade entre as pessoas e auxiliando na
estruturação de relações mais harmoniosas na sociedade, "construindo
cidadania". Esse é um ponto de vista que dilui o conteúdo religioso que o
Coner/SC reivindica para a disciplina e é do embate entre essas duas
perspectivas que se produz o ensino religioso no estado. A existência desse
embate é, por outro lado, evidência do espaço cedido pelo estado para o
"religioso" no âmbito da formação de cidadãos.
Desde 1999, o Coner/SC tem sido
muito ativo, participando de todos os eventos relativos ao ensino religioso no
estado (congressos de alunos, cursos de formação, etc.). Recentemente, a partir
de 2002, passou a reunir-se na sede da Secretaria de Educação e tem recebido
dela recursos para visitar as coordenações regionais, promovendo seminários
sobre o ensino religioso, divulgando os princípios definidos pelo Fonaper e
pela lei. Produziu, também, boletins informativos, sob os auspícios da Secretaria
de Educação, e tem uma webpage. Deve-se dizer que na mudança de governo,
em 2003, o estado contou com um secretário da Educação com fortes raízes na
Igreja católica, o que facilitou a continuação do diálogo. Ainda assim, o
Coner/SC continua disseminando sua perspectiva do ensino religioso e criticando
a perspectiva que o limita à construção de cidadãos: para o Coner é um direito
do cidadão ser informado sobre o transcendente e sobre as formas de acesso a
ele. E a SE o apóia, convencida de que o Coner/SC realiza a incumbência de
difundir valores positivos para a cidadania.15
V
Em todas as interpretações da lei
que mostramos há um componente comum: definem religião como o que remete ao
transcendente, ainda que definam sua função de forma diferente. A diferença
mais definida entre as interpretações dos Coner de São Paulo e Santa Catarina,
de um lado, e as Secretarias da Educação, de outro, diz respeito a um embate
sobre o lugar da religião no espaço público gerenciado pelo estado. Nesse caso,
em que o ensino religioso é o objeto da diferença, fica claro que ele não só é
um instrumento legal que opera uma regulamentação do campo religioso e sua relação
com o estado, pelo qual o estado tem o poder de definir o espaço do religioso
na esfera pública (Giumbelli, 2000, p. 156 e seguintes). De uma outra
perspectiva, a nova lei operou a possibilidade de outros dois movimentos: uma
instrumentalização legal da religião (ou do "religioso") na sua
demanda por um lugar específico na esfera pública (da qual a "entidade
congregadora de várias denominações" seria a principal ferramenta), uma
instrumentalização que, do ponto de vista dos estados em questão, teria, por um
lado, uma componente informativo e, do outro, disciplinador; ao
instrumentalizá-la, tornou-a dependente de (e obrigou a) uma concertação de
"religiões" para garantir sua eficiência e eficácia. Com isto,
assumiu uma definição de "religião" que a antepõe ao Estado laico.
É possível visualizar outras duas
conseqüências inter-relacionadas. Realizar uma concertação de religiões, em
Santa Catarina,16 possibilitou acesso ao espaço público de outras religiões que
não as igrejas instituídas,17 além de algumas igrejas até então dele ausentes. Se esse acesso
se deu sob a égide da Igreja católica, o que acontece também em outros estados
(Giumbelli, 2004), ainda assim, no caso de Santa Catarina (e potencialmente em
outros estados), viabiliza uma imagem pública de religiões não cristãs sob o
manto da legitimidade da existência e atuação do Coner/SC, tornando o Coner
(produto da lei) um instrumento político para a religião com alcance mais amplo
do que a lei previa. No Estado de São Paulo, o movimento das religiões não
cristãs para integrar o Coner é recente (como é recente a abertura do Coner/SP
para elas) e parece responder a essa oportunidade de legitimação no espaço
público (Lui, 2006).18
Por outro lado, onde essa
concertação das religiões não pôde se realizar, o estado dispôs de maior
autonomia na utilização da lei. Por outro lado, ainda, as perspectivas dos dois
estados sobre a presença do "religioso" na escola sendo diametralmente
opostas, em São Paulo, negada enquanto "religião" e afirmada enquanto
tradição histórica e cultural, em Santa Catarina, assumida como
"religião" depositária de significados necessários para a formação de
cidadãos, bons cidadãos, mostra que, em última instância, é do âmbito do estado
a decisão sobre a presença da religião no espaço público.19 Enquanto em São Paulo a ingerência da religião sobre a educação
é vista como "rival" à do Estado laico, em Santa Catarina ela é vista
como complementar. Interessante, nos dois casos, que enquanto a interpretação
do "não proselitismo" em São Paulo se pauta por uma concepção estrita
do Estado laico, em Santa Catarina, o Estado é mais ambíguo: há uma aceitação
tácita da concepção do Coner de que proselitismo seria a tentativa de conversão
ou catequese (Dickie, 2003, 2006). Essa ambigüidade abriu para uma
"acomodação" com a religião. A "acomodação" entre o Estado
e a religião é, em certa medida, mediada pelos cursos de Ciências da Religião,
que estão nas mãos de professores mais ou menos diretamente vinculados à Igreja
católica ou à Igreja luterana (IECLB), agentes históricos do ensino religioso
ali. Assim, apesar da constituição do Coner e seu aparente sucesso como agente
do ensino religioso em Santa Catarina, tendo sido capaz de um
"macroecumenismo" (em sua autodefinição) continua na mão de
princípios cristãos o magistério do ensino religioso.
É importante mencionar que essa
"mão cristã" – numa versão "progressista" – é a grande
força por trás da própria definição legal do ensino religioso. E a ambigüidade
que se realiza em Santa Catarina tem correspondência numa interpretação da lei
ao nível da lei maior. Em novembro de 2004, a Secretaria Especial de Direitos Humanos
da Presidência da República editou uma cartilha para auxiliar na implantação do
ensino religioso, com o título Diversidade Religiosa e Direitos Humanos,
que é menos uma "cartilha republicana" do que uma "cartilha religiosa"
e, mais especificamente, uma cartilha cristã: se em seu bojo está o direito à
diferença (de religiões como afeta ao arbítrio do indivíduo) como princípio
indiscutível, a justificativa desse direito se apóia na vontade divina que
"quer" a convivência de "seus filhos" em paz,
"quaisquer que sejam os nomes pelos quais O nomeiem"! Se o texto se
constrói por uma lógica impecável, o tom do discurso é catequético, a
"tolerância" tomando o lugar do "direito", tendo como
referência documentos de entidades religiosas mundiais e fatos recentes da
historia do país (Brasil, 2004).
Que a questão do ensino religioso
no Brasil possa ser pensada como parte atual de uma disputa histórica, presente
em todo o processo de secularização do Estado brasileiro (Giumbelli, 2000), a
respeito das prerrogativas "rivais" da religião e do Estado sobre o
controle da educação dos cidadãos, vislumbra-se ainda numa afirmação sutil
constante do Balanço Sobre Ensino Religioso da CNBB. Quando se refere ao
não proselitismo contido na lei como resultado da preocupação dos legisladores
pelo tipo de ensino religioso com o qual o Estado se responsabilizaria,
"por causa da tradicional argumentação republicana da 'separação Estado e
Igreja', 'Estado e Religião'" (CNBB, [s.d.], item 2.3), a religião sugere
uma não concordância com a separação mencionada, o que sugere, por sua vez, do
seu ponto de vista, que a ingerência do Estado sobre a religião opera uma
inversão de fatores, nesse caso com conseqüências radicais. O ensino religioso
é uma plataforma onde se dá o embate entre religião e Estado em que, ao que
parece, a religião recusa assumir-se como parte derrotada.
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LUI, Janayna A. "Em nome de
Deus": um estudo sobre a implementação do ensino religioso nas escolas
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Universidade Federal de Santa Catarina, 2006. [ Links ]
ROMANO, Roberto. Brasil:
Igreja contra o Estado. São Paulo: Kairós, 1979. [ Links ]
Recebido em 11/10/2006
Aprovado em 30/11/2006
Aprovado em 30/11/2006
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Uma primeira versão deste trabalho foi apresentada no GT Religião, poder e
política, da XIII Jornadas sobre Alternativas Religiosas na América Latina,
PUC-RS, Porto Alegre, em setembro de 2005. Agradecemos os comentários dos
participantes, todos instigadores de novas reflexões.
** Doutoranda em Antropologia Social.
1 A idéia de esqueletização encerra o sentido de redução do fato à letra da lei, configurando assim o que chamamos "fato jurídico". A interpretação, realizada como produto da relação entre o intérprete e o que se dá à interpretação, como que coloca "carnes ao esqueleto", para retornar a uma expressão malinowskiana clássica, num outro contexto (ver Geertz, 1983, para a idéia da esqueletização operada pelo direito).
2 Referimo-nos aqui à abordagem processualista nos moldes do proposto por Swartz, Turner e Tuden (1966), em que se considera a ação e as relações dos diversos sujeitos envolvidos no processo político.
3 Posteriormente, uniu-se a esse grupo o Conselho Nacional das Igrejas Cristãs (Conic).
4 Sancionada em 20 de dezembro de 1996, por Fernando Henrique Cardoso, a lei nº 9349 foi publicada no Diário Oficial no dia 23 do mesmo mês.
5 Texto da lei nº 9475, de 20 de julho de 1997 (Brasil, 1997): "Art. 1º – O art. 33 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a vigorar com a seguinte redação: Art. 33 – O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo. § 1º – Os sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos para a definição dos conteúdos do ensino religioso e estabelecerão as normas para a habilitação e admissão dos professores. § 2º – Os Sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos do ensino religioso. Art. 2º – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação. Art. 3º – Revogamse as disposições em contrário."
6 De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação de 1971, em que o ensino religioso foi colocado em posição de destaque, como parte do sistema escolar e do Currículo Pleno, não só não era obrigatório como era de responsabilidade das igrejas interessadas. (Figueiredo, 1994, p. 91 e seguintes)
7 Projeto de lei nº 1036, de 1999, de autoria do deputado católico José Carlos Stangarlini (PSDB) e sob a orientação do setor de ensino religioso da Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), Regional Sul I. O deputado Stangarlini é também representante da Renovação Carismática Católica em São Paulo.
8 De acordo com o único participante não cristão filiado que entrevistamos (religião afro-brasileira), a predominância de denominações cristãs no Coner dificultou a adesão de grupos não cristãos. O Coner/SP se reúne na Casa da Reconciliação, entidade que reúne vários movimentos cristãos. Entre eles, o Movimento de Fraternidade das Igrejas Cristãs (Mofic). Esse grupo é formado pelas seguintes igrejas: metodista, luterana, Armênia, presbiteriana unida e anglicana. Do Mofic saíram outros membros da diretoria, ou seja, a secretária que está até hoje no Coner nessa função (da Igreja metodista), a diretora administrativa que também permanece desde o inicio (da Igreja episcopal anglicana). Para o Conselho Fiscal, um pastor da luterana (que se afastou do Coner por determinações da própria igreja), um representante da presbiteriana unida (que raramente aparece nas reuniões) e um padre da Igreja católica (que ainda está associado ao Coner e é considerado um bom articulador pelos demais membros). Essas são as mesmas igrejas que participaram da fundação do Coner em 1997.
9 Atualmente, o Coner tem se esforçado para fazer um mapeamento da situação do ensino religioso nas escolas através da distribuição de um questionário entre os professores que ministram as aulas, com o intuito de entregar um relatório à secretaria.
10 Se esta interpretação abriu espaço para participantes/membros das religiões afro-brasileiras, do líder de um ashram e de um monge budista, gerou nas definições estatutárias do Coner/SC alguns problemas que continuam sendo objeto de discussão: a questões da representatividade e das contribuições para o funcionamento administrativo do Coner são exemplos significativos.
11 À época, Espiridião Amim.
12 O Estado de Santa Catarina foi o primeiro a implantar licenciaturas em Ciências da Religião após a promulgação da lei em 1997.
13 A maioria significativa desses alunos é de mulheres católicas.
14 Após o decreto nº 3.882, de 28 de dezembro de 2005, e o parecer nº 025, de 7 de março de 2006, do Conselho Estadual de Educação. Por alguns dias, após ter sido noticiada a regulamentação, a imprensa falada e escrita trouxe especialistas para esclarecer o caráter facultativo da disciplina para o aluno e a obrigatoriedade de oferecimento pela escola. Esses esclarecimentos respondiam a uma onda de protestos indignados pelo entendimento do público de que o ensino religioso seria obrigatório para os alunos.
15 O Coner/SC tem tido dificuldades financeiras para manter uma estrutura administrativa. Essas dificuldades têm sido mitigadas pelo apoio logístico da Secretaria de Educação.
16 Informações pessoais de membros do Coner/SC indicam que isso também aconteceu em alguns estados do Nordeste brasileiro.
17 Diferentemente de outros estados brasileiros, em Santa Catarina e no Rio Grande do Sul, em virtude das imigrações alemãs, primariamente, a presença ou não da Igreja luterana na escola pública sempre foi motivo de discussão. No Rio Grande do Sul, nas regiões de colonização alemã, historicamente havia "aulas de religião" ministradas por pastores. Não conhecemos a realidade do ensino religioso no Rio Grande do Sul atualmente.
18 O caso apresenta, ainda um paradoxo: os não cristãos que aderiram ao Coner/SP são contrários ao ensino religioso (Lui, 2006).
19 O caso do Rio de Janeiro, em que a confessionalidade foi definida por lei para o ensino religioso, permitindo uma interpretação dessa lei como contrária ao principio da lei maior (explícita na versão da Secretaria de Educação de São Paulo), vê-se uma rigidez maior das igrejas cristãs na definição dos princípios morais passiveis de formar bons cidadãos.
** Doutoranda em Antropologia Social.
1 A idéia de esqueletização encerra o sentido de redução do fato à letra da lei, configurando assim o que chamamos "fato jurídico". A interpretação, realizada como produto da relação entre o intérprete e o que se dá à interpretação, como que coloca "carnes ao esqueleto", para retornar a uma expressão malinowskiana clássica, num outro contexto (ver Geertz, 1983, para a idéia da esqueletização operada pelo direito).
2 Referimo-nos aqui à abordagem processualista nos moldes do proposto por Swartz, Turner e Tuden (1966), em que se considera a ação e as relações dos diversos sujeitos envolvidos no processo político.
3 Posteriormente, uniu-se a esse grupo o Conselho Nacional das Igrejas Cristãs (Conic).
4 Sancionada em 20 de dezembro de 1996, por Fernando Henrique Cardoso, a lei nº 9349 foi publicada no Diário Oficial no dia 23 do mesmo mês.
5 Texto da lei nº 9475, de 20 de julho de 1997 (Brasil, 1997): "Art. 1º – O art. 33 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a vigorar com a seguinte redação: Art. 33 – O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo. § 1º – Os sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos para a definição dos conteúdos do ensino religioso e estabelecerão as normas para a habilitação e admissão dos professores. § 2º – Os Sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos do ensino religioso. Art. 2º – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação. Art. 3º – Revogamse as disposições em contrário."
6 De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação de 1971, em que o ensino religioso foi colocado em posição de destaque, como parte do sistema escolar e do Currículo Pleno, não só não era obrigatório como era de responsabilidade das igrejas interessadas. (Figueiredo, 1994, p. 91 e seguintes)
7 Projeto de lei nº 1036, de 1999, de autoria do deputado católico José Carlos Stangarlini (PSDB) e sob a orientação do setor de ensino religioso da Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), Regional Sul I. O deputado Stangarlini é também representante da Renovação Carismática Católica em São Paulo.
8 De acordo com o único participante não cristão filiado que entrevistamos (religião afro-brasileira), a predominância de denominações cristãs no Coner dificultou a adesão de grupos não cristãos. O Coner/SP se reúne na Casa da Reconciliação, entidade que reúne vários movimentos cristãos. Entre eles, o Movimento de Fraternidade das Igrejas Cristãs (Mofic). Esse grupo é formado pelas seguintes igrejas: metodista, luterana, Armênia, presbiteriana unida e anglicana. Do Mofic saíram outros membros da diretoria, ou seja, a secretária que está até hoje no Coner nessa função (da Igreja metodista), a diretora administrativa que também permanece desde o inicio (da Igreja episcopal anglicana). Para o Conselho Fiscal, um pastor da luterana (que se afastou do Coner por determinações da própria igreja), um representante da presbiteriana unida (que raramente aparece nas reuniões) e um padre da Igreja católica (que ainda está associado ao Coner e é considerado um bom articulador pelos demais membros). Essas são as mesmas igrejas que participaram da fundação do Coner em 1997.
9 Atualmente, o Coner tem se esforçado para fazer um mapeamento da situação do ensino religioso nas escolas através da distribuição de um questionário entre os professores que ministram as aulas, com o intuito de entregar um relatório à secretaria.
10 Se esta interpretação abriu espaço para participantes/membros das religiões afro-brasileiras, do líder de um ashram e de um monge budista, gerou nas definições estatutárias do Coner/SC alguns problemas que continuam sendo objeto de discussão: a questões da representatividade e das contribuições para o funcionamento administrativo do Coner são exemplos significativos.
11 À época, Espiridião Amim.
12 O Estado de Santa Catarina foi o primeiro a implantar licenciaturas em Ciências da Religião após a promulgação da lei em 1997.
13 A maioria significativa desses alunos é de mulheres católicas.
14 Após o decreto nº 3.882, de 28 de dezembro de 2005, e o parecer nº 025, de 7 de março de 2006, do Conselho Estadual de Educação. Por alguns dias, após ter sido noticiada a regulamentação, a imprensa falada e escrita trouxe especialistas para esclarecer o caráter facultativo da disciplina para o aluno e a obrigatoriedade de oferecimento pela escola. Esses esclarecimentos respondiam a uma onda de protestos indignados pelo entendimento do público de que o ensino religioso seria obrigatório para os alunos.
15 O Coner/SC tem tido dificuldades financeiras para manter uma estrutura administrativa. Essas dificuldades têm sido mitigadas pelo apoio logístico da Secretaria de Educação.
16 Informações pessoais de membros do Coner/SC indicam que isso também aconteceu em alguns estados do Nordeste brasileiro.
17 Diferentemente de outros estados brasileiros, em Santa Catarina e no Rio Grande do Sul, em virtude das imigrações alemãs, primariamente, a presença ou não da Igreja luterana na escola pública sempre foi motivo de discussão. No Rio Grande do Sul, nas regiões de colonização alemã, historicamente havia "aulas de religião" ministradas por pastores. Não conhecemos a realidade do ensino religioso no Rio Grande do Sul atualmente.
18 O caso apresenta, ainda um paradoxo: os não cristãos que aderiram ao Coner/SP são contrários ao ensino religioso (Lui, 2006).
19 O caso do Rio de Janeiro, em que a confessionalidade foi definida por lei para o ensino religioso, permitindo uma interpretação dessa lei como contrária ao principio da lei maior (explícita na versão da Secretaria de Educação de São Paulo), vê-se uma rigidez maior das igrejas cristãs na definição dos princípios morais passiveis de formar bons cidadãos.
Programa de
Pós-Graduação em Antropologia Social - IFCH-UFRGS
Av.
Bento Gonçalves, 9500
91509-900 Porto Alegre RS Brasil
Tel.: + 55 51 3308-6638
Fax: +55 51 3308-6638
horizontes@ufrgs.br
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FONTE
. Disponível
em:< http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-71832007000100011>.
Acesso em:13 maio 2011.
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